Às 21h22 do dia 18 de novembro de 2012, o Palmeiras foi rebaixado – pela segunda vez em sua história. A notícia chegou para os jogadores no ônibus da equipe, na altura do km 322 da Via Dutra, após um empate em 1 a 1 com o Flamengo, em Volta Redonda. Neste sábado, 343 dias depois e 34.079km percorridos, parte deles por terra, outra pelo ar, o Verdão voltou para casa (veja no vídeo). Voltou para o seu lugar. Voltou para a elite do futebol brasileiro.
Essa odisseia foi acompanhada de perto pelo GloboEsporte.com. O Palmeiras jogou em cidades onde nunca havia atuado antes, como Ceará-Mirim (RN); foi saudado por dezenas de torcedores em motocicletas, num buzinaço que acompanhou o trajeto do ônibus entre Crato (CE) e Juazeiro do Norte (CE); tomou sol na piscina num resort de luxo em Natal (RN), mesma cidade onde, por pouco, não viu uma tragédia na arquibancada de um Frasqueirão lotado; atraiu multidões que o fizeram se sentir como mandante mesmo quando atuava em cidades de outros estados, como em Belo Horizonte (MG) e Londrina (PR); venceu cinco partidas de virada, sendo três como visitante, mostrando que tinha os nervos no lugar e que nada seria capaz de abalá-lo durante a campanha, coroada neste sábado, no Pacaembu. O Verdão se mostrou imponente, com fibra de campeão. Mostrou que é grande demais para a Segunda Divisão.

O que você vai ver abaixo são relatos de cada viagem feita pelos repórteres Marcelo Hazan e Rodrigo Faber, que acompanharam o Palmeiras em todos os jogos da Série B fora de casa. Eles foram testemunhas de que, onde quer que o Verdão fosse, uma multidão acompanharia a equipe, ajudando o time em seu retorno para casa.
Arapiraca, Brasil
Devido a uma punição do STJD por conta de incidentes causados pela sua torcida durante o Brasileirão do ano passado, o Verdão iniciou a Série B mandando seus jogos em Itu – cidade que de tão próxima a São Paulo partilha do mesmo DDD (11). Após uma vitória simples sobre o Atlético-GO, o Verdão viajou para encarar o ASA, em Arapiraca, no sertão alagoano.

dos baianos de Salvador
Na primeira noite, tudo tranquilo no hotel cinco estrelas de Maceió. Na segunda, véspera do jogo, uma viagem tensa pela estreia AL-220, num percurso de apenas 125km, mas que durou quase duas horas. Foi ali que caiu a ficha para os palmeirenses. Série B é outro mundo. É outro Brasil. Os moradores dos pequenos vilarejos que margeiam a estrada saíram de casa para ver o Verdão passar. Pela janela, jogadores com salários de seis dígitos viam uma paisagem árida – muita terra, pouco verde.
Em Arapiraca, um único hotel serviu de hospedagem para todos os que se moviam por conta do jogo – time, comissão técnica, dirigentes, jornalistas e alguns torcedores. O Coaracy da Mata Fonseca é um estádio simples, mas melhor do que muitos de São Paulo. A internet wi-fi, por exemplo, estava voando. Em campo, a diferença técnica entre os dois times era gritante, e o Palmeiras meteu 3 a 0 ainda no primeiro tempo – 9.402 torcedores. Seria essa a tônica da Série B?
Cadê a torcida?

em Presidente Prudente
Os dois jogos seguintes foram em Itu, famosa por ser “a cidade dos exageros”, e também o lar do Ituano, time que nunca esteve entre os campeões de audiência do interior paulista. Contra o América-MG, a primeira derrota, com 7.747 pessoas no estádio Novelli Júnior (que tem capacidade para 18 mil). No jogo seguinte, público menor ainda – só 5.792 viram os 2 a 1 sobre o Avaí. E a diretoria alviverde decidia – se é preciso jogar fora de São Paulo, que seja numa cidade onde a torcida demonstre maior interesse. Assim, o jogo contra o Oeste, que marcou o retorno de Valdivia (em grande estilo, numa goleada por 4 a 0), foi em Presidente Prudente. Mas o público ficou na média de Itu – 7.543 pessoas.
Sol e chuva no Nordeste

seguinte à derrota para o Sport
Antes, porém, o Verdão passou cinco dias no Nordeste – viajou numa sexta-feira e voltou na quarta. No sábado, encarou o Sport, segundo time de maior torcida na competição e com uma rivalidade criada nos anos de 2008 e 2009, quando se encontraram na Copa do Brasil e depois na Libertadores. A Ilha do Retiro estava lotada, e um dilúvio caiu na metade do primeiro tempo. O clima era hostil, e o time acabou derrotado graças a um erro da arbitragem e um gol de Nunes, velho carrasco em jogos por Santo André e Bragantino. Mas até por conta da grandeza do adversário e da logística mais fácil – com hospedagem em hotel cinco estrelas na praia de Boa Viagem -, havia a percepção de que se tratava de um jogo de Série A dentro da Série B, e que aquela derrota, por mais que dolorida, não seria capaz de abalar a equipe.
O jogo seguinte foi no Rio Grande do Norte, na terça-feira, contra o América-RN. O Verdão se hospedou num belo resort em Natal, com direito a muito sol na piscina. O local do jogo, porém, não tinha nada de conforto – um estádio de propriedade de um empresário, recém-inaugurado (e mal acabado), em Ceará-Mirim, cidade vizinha à capital potiguar. Foram 40km de ônibus. No fim, vitória por 2 a 0 e volta tranquila para casa.
Time de primeira

A vitória de virada em Florianópolis sobre o Figueirense, outro antigo rival de Série A, foi a primeira em que a torcida viu que o Verdão era, novamente, um time confiável. Num jogo com chuva e arbitragem confusa, Valdivia brilhou, e o Verdão venceu por 3 a 2. Era a retomada do torneio após o recesso para a disputa da Copa das Confederações. Gilson Kleina e seus colegas de comissão técnica nunca esconderam que essa pausa no calendário para treinos foi fundamental para que a equipe encorpasse, tanto fisicamente como em termos de posicionamento. No total, foram dez jogos de invencibilidade após o recesso da Copa das Confederações. E a certeza de que o retorno à Primeira Divisão era questão de tempo para o Verdão.
Presos no elevador

elevador do hotel de Joinville
Em Joinville, um susto. Gilson Kleina e outros membros da comissão técnica ficaram presos no elevador do hotel por quase 30 minutos. todos trataram o problema com bom humor e até riram da situação enquanto estavam presos. Após tentativas frustradas de funcionários do local e de seguranças palmeirenses para consertar o elevador, um técnico foi acionado e resolveu o problema. Em campo, vitória apertada (1 a 0) sob chuva e frio na Arena Joinville. Era o quarto resultado positivo consecutivo. Apesar disso, o time seguia em segundo, graças à surpreendente campanha da Chapecoense. O primeiro lugar só seria conquistado na rodada seguinte, com uma vitória maluca e tensa sobre o Paysandu, em São Paulo.
Força da torcida

Com quase 19 mil pagantes no Pacaembu, o Palmeiras penou para ganhar do Paysandu e assumir a liderança da Série B, posto que não viria mais a abandonar. Foi um dos jogos mais tensos da campanha – o Verdão saiu perdendo por 2 a 0 e virou para 3 a 2 nos minutos finais em meio a muitas polêmicas e até uma briga generalizada, que depois levou Mendieta (quatro jogos) e Wesley (dois) a serem penalizados no STJD. Curiosamente, foi a confusão que fez com que o time acordasse em campo e, movido pela força de sua torcida, virasse o jogo sobre o Paysandu. Dos 10 maiores públicos da Série B, nove foram em partidas do Palmeiras, sendo cinco deles no Pacaembu, casa da equipe enquanto o Allianz Parque não fica pronto.
Grande em todo lugar, susto em Natal

esmagado
Em Varginha (contra o Boa Esporte), Itumbiara (Atlético-GO), Belo Horizonte (América-MG), o Palmeiras foi visitante, mas tinha mais torcida que o time da casa. A exceção foi em Natal, diante do ABC, quando uma tragédia por pouco não ocorreu no estádio Frasqueirão, por conta da superlotação. Na ocasião, o repórter Marcelo Hazan recebeu a ordem para esquecer do jogo e ir para o meio da torcida, para acompanhar o drama dos torcedores do ABC. Muitas pessoas ficaram prensadas no alambrado – outras, principalmente crianças, incentivadas pelos pais, escalaram a grade justamente para fugir do tumulto. Por todo lado, o que se via era gente chorando. No gramado, jogadores tensos acompanhavam tudo com sentimento de impotência. De onde estavam, não havia nada a ser feito, a não ser rezar. Felizmente, ninguém se feriu com gravidade. O jogo começou com 35 minutos de atraso, e o Verdão, um tanto abalado pelo susto, se mostrou irreconhecível em campo e acabou sendo derrotado por 3 a 2.
Gigante no norte paranaense

receber o Palmeiras
Não foi só em São Paulo que o Palmeiras se sentiu em casa. Por conta de nova punição do STJD, o Verdão teve de mandar jogos em Londrina, contra Figueirense e Guaratinguetá. A presença de torcedores em todos os lugares já havia chamado a atenção de jogadores, dirigentes e até mesmo jornalistas em várias oportunidades. Mas nada que se comparasse àquilo visto na cidade do norte paranaense, região que, tradicionalmente, acompanha os times paulistas. A diretoria palmeirense, empolgada, chegou a calcular em 100 mil pessoas o tamanho da torcida alviverde em Londrina, cidade de 540 mil habitantes.
Amado pela torcida cearense

em Juazeiro do Norte
Na chegada do Palmeiras à cidade de Crato, vizinha a Juazeiro do Norte, palco do jogo contra o Icasa, um torcedor arrancou gargalhadas do técnico Gilson Kleina, ao dizer “Ano que vem é o São Paulo que vem pra cá”. O rival paulista estava, à epoca, na zona do rebaixamento, e a brincadeira do palmeirense deixava claro que, para todos ali no interior cearense, a presença de um gigante paulista era um acontecimento. Tudo foi atração. A chegada do time, o percurso até o hotel, o treino… na atividade comandada por Kleina na véspera da partida, crianças invadiram o gramado para serem “gandulas voluntários” e, num determinado momento, passaram a ajudar o técnico no treino, repondo as bolas sob o pé dele para que fossem chutadas para os jogadores. O time foi ovacionado, e cada gesto dos jogadores em direção à arquibancada gerava uma baita festa. No fim, apesar da derrota por 1 a 0 para o surpreendente Icasa, foram saudados pela torcida.
Gostinho de quero mais
Depois da vitória sobre o Bragantino, em Bragança Paulista, o Palmeiras passou a ter a certeza que o acesso seria sacramentado diante do São Caetano, no Pacaembu. Bastava um empate contra o vice-lanterna, e a diretoria teve uma semana para armar a festa – com direito a homenagem a ídolos do passado e estreia de uniforme inspirado na seleção brasileira. Faltou combinar com os jogadores do Azulão, que se desdobraram em campo e seguraram o 0 a 0. Parte dos torcedores – a maioria de uma organizada – vaiou. Mas a maioria aplaudiu o empenho dos jogadores, com a certeza de que, sim, o acesso não era mais do que obrigação, mas que a campanha foi digna de um time com a grandeza do Palmeiras.
